domingo, 29 de julho de 2012

Companhia de Moçambique - "Assistência Pública" sobretaxada

            Por legislação publicada no Boletim Oficial de Moçambique é criada em 11 de Julho de 1908, em Lourenço Marques, a Comissão de Beneficência Pública. Iniciou-se nesta data a prestação de serviços de assistência pública organizada e controlada pelo governo, através da referida Comissão cuja composição era a seguinte: Prelado de Moçambique que a presidia, um administrador do Concelho, o pároco de Lourenço Marques e dois representantes das duas associações de beneficência – Sociedade Portuguesa de Beneficência e Sociedade de Instrução e Beneficência 1.º de Janeiro.
            A Comissão tinha como principal incumbência a administração dos fundos da beneficência pública e aplicá-los de forma racional e útil em benefício dos pobres, inválidos, doentes e das crianças pobres e abandonadas.
Beira - Hospital Indígena
            A partir de 1912 a assistência pública fica a ser exercida pelas duas associações atrás referidas. Em 19 de Janeiro de 1918 através do Boletim Oficial é noticiada nova reorganização da Comissão que passa a ser constituída por sete elementos, dos quais seis eram propostos pela Sociedade Portuguesa de Beneficência e pela Sociedade de Instrução e Beneficência 1.º de Janeiro. Ainda em Maio desse mesmo ano, considerando-se que, embora as duas associações de beneficência tenham vindo a prestar um serviço meritório, não deveriam representar por si só todas as outras agremiações que prestavam também o mesmo tipo de assistência, pelo que foi resolvido criar a denominada Comissão Central de Assistência Social da Província de Moçambique, que para além das duas associações iniciantes, passou a contar com delegados de todas as associações legalmente constituídas e que pretendessem participar no projecto.
            A esta nova Comissão mais abrangente, pois passou a prestar auxílio em toda a Colónia de Moçambique, também foi incumbida de prestar assistência escolar aos cidadãos mais desfavorecidos.
Chimoio - Escola Caldas Xavier
            Em 11 de Outubro de 1927 é feita uma nova reorganização dos serviços de assistência pública, cuja principal nuance será a criação do cargo de Provedor, cuja nomeação estava a cargo do Governo-Geral.
            As receitas da Assistência Pública eram constituídas por subsídios; pelas rendas, percentagens e mais receitas provenientes da exploração de lotarias; por taxas e emolumentos cobrados a estrangeiros pelos bilhetes de residência; pelo rendimento do selo de Assistência Pública; pelo rendimento dos estabelecimentos a seu cargo e ainda por doações ou legados.
Neves Ferreira - Hospital Indígena
            A Companhia de Moçambique também colaborou e prestou assistência aos desfavorecidos criando para tal a Comissão de Beneficência e Assistência Pública da Companhia de Moçambique que se regia pelo Diploma Legislativo da Colónia, n.º 29 de 11 de Outubro de 1927 e que foi mandado adoptar pela Companhia de Moçambique pela sua Ordem n.º 6273 de 6 de Abril de 1931.
            A emissão dos respectivos selos de Assistência Pública foi autorizada pela Ordem n.º 6380 de 15 de Dezembro de 1931, sob proposta da Comissão de Beneficência Pública do Território da Companhia de Moçambique, e tendo como base a adopção da Portaria n.º 890 de 18 de Maio de 1929 do Governo-Geral da Colónia, convertendo a taxa nela fixada no seu equivalente em moeda do Território da Companhia.
            É o seguinte o articulado da Ordem n.º 6380:
            Como podemos verificar os primeiros selos da Assistência Pública resultaram da sobretaxa do selo de correio ordinário de 3c ocre e negro da emissão base (Motivos locais) emitidos em 1921/23 – Afinsa 142.
            Estes selos foram retirados de circulação pela Ordem n.º 6763 de 27 de Abril de 1934, e mandados substituir pelos selos definitivos deste imposto postal.
            A impressão das sobrecargas foi feita localmente em folhas de 100 selos, existindo variados erros e deficiências na composição das sobrecargas, originadas provavelmente pela falta de quantidades suficientes de tipos iguais para compor uma chapa para 100 selos:
            Os principais erros encontrados são os seguintes:
Sobrecarga invertida
              Sem acentos             "ê" em vez de "e"      "ê" e "ú" em vez de "e" e "u"

Sobrecarga dupla
Sobrecarga tripla (?)
            As principais variedades são as seguintes:
“Assistência” e “Pública” sem acentos
“Assistência” com “ê” em vez de “e”
“Pública” com “ú” em vez de “u”
Posições 61, 62, 71 e 72 da folha. Dois primeiros selos com todos os acentos e dois últimos com "ú" em vez de "u"
“Assistência Pública” com “ê” e “ú” em vez de “e” e “u”
Estudo da folha de 100 selos com a distribuição das variedades
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100


  Sem acentos

  “ê” em vez de “e”

  “ê” e “ú” em vez de “e” e “u”

  “ú” em vez de “u”

            Como podemos verificar a variedade “ú” em vez de “u” é a mais escassa, existindo apenas dois selos em cada folha de 100 e ocupando as posições de 71 e 72 da folha. Porém o catálogo da especialidade não reflecte no seu precário a raridade da variedade, valorizando-a ao mesmo nível das restantes.
            Assim, e em resumo, são as seguintes as quantidades de cada uma das variedades, existentes em cada folha de 100 selos.
                                   36 selos “sem acentos”
                                   25 selos com “ê” em vez de “e”
                                   37 selos com “ê” e “ú” em vez de “e” e “u”
                                     2 selos com “ú” em vez de “u”
            Atendendo-se à distribuição quantitativa das variedades em cada folha, não entendemos também a sua valorização no catálogo que actualmente é editado pela Afinsa. Existem 36 selos em cada folha com a variedade “sem acentos” e 37 selos com a variedade “ê” e “ú” em vez de “e” e “u”. Os primeiros são valorizados a 4,00 euros cada e os segundos a 15,00 euros casa. Dá para entender? Não. Entendo que estas valorizações deverão ser corrigidas.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Carimbos numéricos volantes (39) * Benguela-Velha / Porto Amboim

Vista geral de Porto Amboim
Neste ligeiro artigo vou referir-me a mais um dos carimbos numéricos volantes, este com o número “39”, que serviram como marcas de recurso em estações postais recém-criadas ou em estações que por qualquer razão não pudessem utilizar as suas marcas de dia. Conforme artigo intitulado “Carimbos numéricos volantes (00) * Introdução” editado neste blog, este carimbo pertence ao tipo 3, cuja tipologia é comum aos carimbos numéricos números 31 ao 40.
Mais uma vez recordo que estes carimbos de acordo com o fim específico para o qual foram criados, deveriam ter uma permanência curta nas estações a que fossem atribuídos, porém este carimbo que agora apresento é um dos muitos que permaneceram por longos períodos nas estações postais.
O carimbo foi atribuído à estação postal de Benguela-Velha pela Ordem de Serviço n.º 97 de 23 de Março de 1917 da Repartição Superior dos Correios de Angola, que abaixo reproduzimos.
            A estação postal de Benguela-Velha foi criada pela Portaria Provincial n.º 782 de 3 de Setembro de 1910, assinada pelo então Governador-Geral José Augusto Alves Roçadas. A estação postal tinha a categoria de 3.ª classe e ficou a cargo do regedor da povoação.
            Por Portaria n.º 148 de 18 de Maio de 1920, e porque tendo sido entretanto criado o concelho de Benguela-Velha, a respectiva estação postal foi elevada à categoria de 2.ª classe, e como principiou também a prestar serviço telegráfico passou a denominar-se Estação Telégrafo-Postal de Benguela-Velha
            Pelo Decreto n.º 352 de 10 de Setembro de 1923, publicado no Boletim Oficial n.º 38 a povoação de Benguela-Velha foi elevada à categoria de Vila e alterou o seu nome para Porto Amboim, assim como o concelho de Benguela-Velha também foi rebaptizado em Concelho de Porto Amboim.
Conforme referimos Benguela-Velha foi o nome primitivo de uma localidade a que foi atribuído o nome de Porto Amboim. Nesse local existia uma aldeia chamada Kissonde, integrando uma região que os portugueses tentaram colonizar por volta do ano de 1587 fundando aí uma povoação a que foi dado o nome de Benguela. Esta povoação foi mais tarde abandonada e reconstruída mais a sul onde hoje está localizada a actual cidade de Benguela. Cerca do ano de 1771 os portugueses voltaram ao local primitivo e reergueram a antiga povoação atribuindo-se-lhe o nome de Benguela-Velha e conforme afirmamos passou a denominar-se Porto Amboim em 1923 com a categoria de vila. Em 15 de Janeiro de 1974 foi elevada à categoria de cidade.
Porto Amboim era uma importante localidade, testa do Caminho de Ferro do Amboim que a ligava à Gabela e por onde eram escoados os produtos região, especialmente o café, produzido por três grandes empresas (CADA, Marques Seixas e Mário Cunha), uma das mais importantes fontes de riqueza na região.
A passagem para o planalto a caminho da Gabela era feita muito lentamente através de “lacetes” (oitos quase fechados). Para viagens mais rápidas entre Porto Amboim e a Gabela os passageiros alugavam automóveis de linha a que chamavam “Grazine”. A linha telegráfica entre Porto Amboim e a Gabela era também assegurada pela Companhia do Amboim. A linha ferroviária também facilitava a troca de correspondências de estação a estação pelos dos condutores dos comboios, conforme podemos apreciar pela imagem que reproduzimos abaixo.





Carimbo ferroviário PORTO AMBOIM
Bilhete do CFA com carimbo ferroviário QUIRIMBO

Tinha também um porto marítimo que ajudava a drenar a rica produção da região.
Voltando ao serviço de correio da estação postal de Benguela-Velha / Porto Amboim, direi que não são conhecidas marcas obliteradoras desde a sua criação em 1910 até à distribuição do carimbo numérico volante. Provavelmente as obliterações das correspondências seriam manuscritas, como acontecia em algumas estações postais, privadas de marcas de dia próprias. Durante cerca de 22 anos a estação vai utilizar esta marca para obliterar a correspondência (Figuras 1 e 2).
Figura 1 - Carta circulada registada de Benguela-Velha / Porto Amboim (07.07.28)  para Mulda / Alemanha (13.08.28) com trânsito por Lisboa (08.08.28) e Freiberg (12.08.28) com a franquia de 2$40 correspondente a: 1$60 pelo primeiro porte (cartas com peso até 20gr) para o estrangeiro + $80 prémio de registo. Registo manuscrito. Selos obliterados com carimbo numérico volante n.º 39.
Figura 2 – Carta circulada de Moçamedes para Novo Redondo (22.12.1929) com trânsito por Benguela Velha / Porto Amboim (20.12.1929) com a franquia de $50 correspondente ao primeiro porte para cartas até 20gr circuladas na Província (Portaria Provincial nº 70 de 12.07.1926, publicada no Boletim Oficial de Angola nº 26 de 17.07.1926)

            Finalmente a partir de meados de 1938 ou 1939 foi distribuído um carimbo com topónimo específico da estação postal, do tipo que podemos apreciar na figura abaixo.
Figura 3 – Carta circulada de Porto Amboim (09.01.1948) para Goteborg / Suécia com trânsito por Lisboa (16.01.1948). Pagou de franquia 1$75 pelo primeiro porte para cartas destinadas ao estrangeiro (peso até 20gr) + sobretaxa de correio aéreo de 5$00 pelo primeiro porte (peso até 5gr) para países da Europa (selo fixo de recurso).

            Não garanto que durante o período que medeia o ano da criação da estação postal até à utilização da marca reproduzida na figura 3 não possa ter existido outro tipo de marca obliteradora, porém eu nunca tive conhecimento da existência de tal marca.


Bibliografia
·         Milheiros, 1972 - Índice Histórico-Corográfico de Angola, IICA
·         Anuário de Angola, 1923
·         Dicionário Corográfico Comercial de Angola, Antonito, 2.ª edição 1948